Competência do Crime de Lavagem de Dinheiro: Estadual ou Federal
O crime de lavagem de capitais pressupõe um crime ou contravenção anterior a ele. Exige que a lavagem ou ocultação seja referente a bens e valores ilícitos a fim de dar "aparência de licitude".
A previsão consta no artigo 1º da Lei nº 9.613/98, que trata dos crimes de lavagem e ocultação de bens, direitos e valores:
Art. 1o Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.
§ 1o Incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização de bens, direitos ou valores provenientes de infração penal:
I - os converte em ativos lícitos;
II - os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem em depósito, movimenta ou transfere;
III - importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verdadeiros.
§ 2o Incorre, ainda, na mesma pena quem:
I - utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores provenientes de infração penal;
II - participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crimes previstos nesta Lei.
A competência para processamento e julgamento pode ser do Juízo Estadual, da Justiça Federal, da Justiça Eleitoral, da Justiça Militar e dos respectivos Tribunais Superiores, inclusive o STJ e STF.
A parte investigativa segue os mesmos requisitos.
Se o investigado/acusado for detentor de Foro Privilegiado a competência também muda.
Por isso, para análise da competência é preciso verificar caso a caso.
A apuração do crime de tráfico internacional de entorpecentes que antecede o crime de lavagem de dinheiro é de competência da Justiça Federal Comum, mas o Foro Privilegiado constatado modifica essa competência, não a Federal, mas a Instância.
Havendo indícios de crime eleitoral a competência será da Justiça Eleitoral Comum, como o crime de corrupção que antecede lavagem de capitais com o fim de financiar campanha política.
Sendo assim, fixada a competência material, sobre o local do crime e a matéria, é analisado o Foro Privilegiado, chamado também de Foro por Prerrogativa de Função.
O Foro Privilegiado encontra amparo, principalmente, na Constituição Federal, nos artigos 102, I, "b" e "c" - competência STF; 105, I, "a" - competência do STJ; 125, caput e § 1º; 96, III; e 29, X - competência dos TJ's.
É preciso constante atualização porque a jurisprudência esclarece frequentemente situações sobre a competência, a exemplo do Tema 1147 que está decidindo sobre "Competência do Superior Tribunal de Justiça para processar e julgar desembargador de Tribunal de Justiça por crime comum, ausente relação com o cargo público ocupado".
Esse mesmo julgado abrange a decisão sobre a competência referente a Prerrogativa de Foro de magistrados e membros do Ministério Público, disciplinada no art. 96, III, da CF.
Enquanto isso, a competência para julgar delitos comuns nesses casos é dos Tribunais de Justiça Estaduais.
O Supremo Tribunal Federal é o órgão que julgará os membros do Congresso Nacional em crimes praticados no exercício da função e em razão do cargo público , como decidido na Questão de Ordem na Ação Penal de n.º 937/RJ que fixou a seguinte Tese:
"(i) O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas; e (ii) Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo".
Veja, ainda, a Súmula 702 do STF:
A competência do Tribunal de Justiça para julgar prefeitos restringe-se aos crimes de competência da Justiça comum estadual; nos demais casos, a competência originária caberá ao respectivo tribunal de segundo grau.
Da leitura, concluímos, por exemplo, que o Tribunal Regional Eleitoral é responsável pelo processamento e julgamento no caso de inquérito investigativo de crime eleitoral supostamente praticado por prefeito.
Quando o eleito perde o cargo público a competência pode ser redefinida ou prorrogada, a depender do momento processual.
Vamos, então, a um caso específico:
- O caso trata da apuração de crimes contra a administração e a paz públicas e a ordem socioeconômica, previstos nos artigos 317, § 1º, caput, do Código Penal, 1°, caput, com §4º, II da Lei de Lavagem nº 9.613/1998, e 2°, caput com §3º da Lei de Organização Criminosa nº 12.850/2013 (corrupção passiva, lavagem ou ocultação de capitais e integrar comando de organização criminosa).
- A defesa alegou a competência da Justiça Eleitoral para processar e julgar o feito considerando que houve alegação de que os crimes foram cometidos por motivação política relacionada a campanha eleitoral.
- O Tribunal Estadual aplicou o entendimento do Supremo Tribunal Federal:
A mera alegação, em tese, da prática de crime eleitoral não basta para caracterizar a efetiva violação do entendimento adotado pela CORTE no INQ 4.435 AgR-quarto/DF, com o consequente deslocamento da competência para a Justiça Eleitoral (Rcl 36.665/TO, Rcl 38.275/TO, Rcl 37.322/TO e Rcl 37.751/TO, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES)
- Para tanto, o Tribunal de Justiça considerou que não constava na denúncia crime eleitoral e manteve a competência da Justiça Estadual Comum.
É preciso análise minuciosa do caso específico a fim de verificar a competência.